Especialistas alertam sobre a importância do
diálogo para que a ingestão de bebidas na adolescência não se torne excessiva e
venha a causar dependência
Por Correio
Braziliense Foto: Reprodução / Divulgação/USP
Os demais deveriam ingerir uma dose de vodka pura, caso tivessem passado pela experiência. Depois de três ou quatro goles, já no fim da brincadeira, todos foram parar em outra residência, a garota não soube explicar como. Relata, inclusive, que acordou com uma blusa que não era dela.
A história não é
uma exceção entre os adolescentes. Eles aceleram o processo que, legalmente,
deveria começar apenas aos 18 anos. Há dois anos, a Lei nº 13.106, de 2015,
tornou crime servir bebidas alcoólicas a crianças e a adolescentes.
No mesmo ano de criação da norma, o Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE) mostrou que mais da metade dos estudantes do 9º ano do ensino fundamental no Distrito Federal tinham experimentado álcool pelo menos uma vez.
O número do DF supera a estatística Nacional. Em todo o país, 55,5% dos adolescentes matriculados nessa etapa do ensino admitiram ter bebido uma dose de álcool pelo menos uma vez na vida — 4 pontos percentuais a menos do que no DF — e 18,4% confessaram ter experimentado cigarro. Mais de um quinto dos jovens de 13 a 15 anos brasileiros sofreram algum tipo de embriaguez.
No mesmo ano de criação da norma, o Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE) mostrou que mais da metade dos estudantes do 9º ano do ensino fundamental no Distrito Federal tinham experimentado álcool pelo menos uma vez.
O número do DF supera a estatística Nacional. Em todo o país, 55,5% dos adolescentes matriculados nessa etapa do ensino admitiram ter bebido uma dose de álcool pelo menos uma vez na vida — 4 pontos percentuais a menos do que no DF — e 18,4% confessaram ter experimentado cigarro. Mais de um quinto dos jovens de 13 a 15 anos brasileiros sofreram algum tipo de embriaguez.
Outro relato de
Maria mostra como o acesso ao álcool é facilitado. Dessa vez, ela conta que,
aos 15 anos, foi à festa de uma colega da escola. A regra era que apenas
maiores de 18 anos recebessem uma pulseira e pudessem passar para a área do
bar.
Mas a menor afirma que não foi preciso esperar muito tempo: logo, nenhum barman estava preocupado em checar quem eram as pessoas autorizadas a beber e todos os amigos aproveitaram para escolher os mais diversos drinks que constavam no cardápio.
Nesse dia, ela chegou a perder a bolsa e os sapatos. A adolescente lembra que ficou de castigo depois que a mãe descobriu a primeira aventura com a bebida. “Eu perdi a confiança da minha mãe. Depois da festa, prometi que não ia mais beber”, disse. “Mas, nessa hora, os amigos caçoam, “e fica apenas na promessa”.
Mas a menor afirma que não foi preciso esperar muito tempo: logo, nenhum barman estava preocupado em checar quem eram as pessoas autorizadas a beber e todos os amigos aproveitaram para escolher os mais diversos drinks que constavam no cardápio.
Nesse dia, ela chegou a perder a bolsa e os sapatos. A adolescente lembra que ficou de castigo depois que a mãe descobriu a primeira aventura com a bebida. “Eu perdi a confiança da minha mãe. Depois da festa, prometi que não ia mais beber”, disse. “Mas, nessa hora, os amigos caçoam, “e fica apenas na promessa”.
Em um grupo de 12
menores entrevistados pelo Correio, apenas um afirmou que ainda não tinha
ingerido bebida alcoólica ou fumado. Uma das meninas, de 17 anos, contou que o
“point” é uma praça pública, com árvores, bancos de concreto e pequenos pilares
para exercício, que fica próximo à unidade de ensino onde estudam.
“Quando um dos professores libera, é pra lá que a gente vai”, contou um rapaz. A compra é feita em uma distribuidora de bebidas que não exige nenhum documento dos jovens clientes. De acordo com a adolescente de 17 anos, os amigos ficam tão alcoolizados que é necessário esperar algumas horas até que todos estejam em condições de voltarem para casa. “Eu não sei como que todo mundo consegue ver o número do ônibus ou em qual está entrando”, admitiu.
“Quando um dos professores libera, é pra lá que a gente vai”, contou um rapaz. A compra é feita em uma distribuidora de bebidas que não exige nenhum documento dos jovens clientes. De acordo com a adolescente de 17 anos, os amigos ficam tão alcoolizados que é necessário esperar algumas horas até que todos estejam em condições de voltarem para casa. “Eu não sei como que todo mundo consegue ver o número do ônibus ou em qual está entrando”, admitiu.
A diretora de uma
das escolas também confirma problemas com alunos que passam dos limites. Para
ela, os principais são os que envolvem adolescentes de até 15 anos. Uma menina,
inclusive, levou garrafa de bebida para dentro da área escolar. Segundo a
diretora, o comum é que eles se afastem do colégio para ter mais privacidade.
Porém, quando alguém passa mal por conta dos efeitos do álcool, é a escola o lugar para o qual recorrem. “Eles trazem o amigo que está mal e nós chamamos os responsáveis para que eles levem o aluno ao hospital”, contou.
Porém, quando alguém passa mal por conta dos efeitos do álcool, é a escola o lugar para o qual recorrem. “Eles trazem o amigo que está mal e nós chamamos os responsáveis para que eles levem o aluno ao hospital”, contou.
Entre um trio de adolescentes ouvidos pelo reportagem, todos tinham experimentado alguma bebida, apesar de duas moças não fazerem uso frequente. O rapaz, de 17 anos, contou que também fuma. Eles relataram que os colegas de sala têm um grupo no aplicativo de mensagens WhatsApp e que é por meio dele que geralmente marcam um encontro depois da aula.
Como alguns amigos têm 18 anos, a compra é feita pelos mais velhos. Em uma ocasião, um aluno passou tão mal em uma praça que os próprios moradores das quadras próximas reconheceram o uniforme e avisaram a instituição. “Ele chegou a vomitar em cima do vice-diretor da escola”, contou o adolescente.
Questão social
A principal preocupação com relação ao uso do álcool, segundo especialistas, são os efeitos que a ingestão precoce dessas bebidas podem causar no futuro. “Não é uma coisa da juventude e que depois passa”, observa o sociólogo e especialista em segurança no trânsito Eduardo Biavati.
Os problemas envolvem não apenas o desenvolvimento da dependência física, mas também a criação de hábitos perigosos, como o de dirigir sob o efeito da bebida. Para Biavati, se trata de um problema de saúde pública e que a sociedade precisa aprender a lidar com as transformações pelas quais se passa durante a adolescência — começar a beber, aprender a dirigir, ser aceito pela turma.
A principal preocupação com relação ao uso do álcool, segundo especialistas, são os efeitos que a ingestão precoce dessas bebidas podem causar no futuro. “Não é uma coisa da juventude e que depois passa”, observa o sociólogo e especialista em segurança no trânsito Eduardo Biavati.
Os problemas envolvem não apenas o desenvolvimento da dependência física, mas também a criação de hábitos perigosos, como o de dirigir sob o efeito da bebida. Para Biavati, se trata de um problema de saúde pública e que a sociedade precisa aprender a lidar com as transformações pelas quais se passa durante a adolescência — começar a beber, aprender a dirigir, ser aceito pela turma.
Nesse sentido, a
família tem papel fundamental, alerta o especialista. Segundo ele, é na
pré-adolescência que os pais devem fiscalizar e conversar com os menores, pois,
mais tarde, o controle pode se tornar mais difícil.
“Os pais vão fazer o quê? Ir para as festas? Para as boates? Isso não é realista. A gente consegue ter indícios conversando com os amigos dos filhos e das filhas, falando sobre os amigos. Às vezes, a criança não fala dela, mas fala dos amigos. É muito difícil fazer parte de um grupo e não compartilhar os hábitos dele”, aconselha.
“Os pais vão fazer o quê? Ir para as festas? Para as boates? Isso não é realista. A gente consegue ter indícios conversando com os amigos dos filhos e das filhas, falando sobre os amigos. Às vezes, a criança não fala dela, mas fala dos amigos. É muito difícil fazer parte de um grupo e não compartilhar os hábitos dele”, aconselha.
A psicóloga e
especialista na área de drogas na adolescência Maria Fátima Olivier Sudbrack
acrescenta que a questão do álcool não é apenas culpa dos jovens, mas da
sociedade como um todo.
Segundo ela, a cultura brasileira aceita a bebida como natural e estimula cada vez mais o consumo, mesmo entre os menores. Muito do incentivo vem da própria família ou mesmo da pressão dos amigos, para que o adolescente possa se sentir parte de um grupo.
Segundo ela, a cultura brasileira aceita a bebida como natural e estimula cada vez mais o consumo, mesmo entre os menores. Muito do incentivo vem da própria família ou mesmo da pressão dos amigos, para que o adolescente possa se sentir parte de um grupo.
De acordo com
Maria Fátima, nessa idade, os amigos são as pessoas que mais influenciam, mas
isso não tira a responsabilidade ou mesmo o consentimento dos próprios pais.
“Tem gente que diz que o filho virou homem porque tomou o primeiro porre. Nós chamamos isso de alcoolização da juventude. Não estou querendo que a gente tenha apenas uma visão repressora, mas é uma questão de conscientização e prevenção e de repensar o que estamos mostrando para eles”, explica.
“Tem gente que diz que o filho virou homem porque tomou o primeiro porre. Nós chamamos isso de alcoolização da juventude. Não estou querendo que a gente tenha apenas uma visão repressora, mas é uma questão de conscientização e prevenção e de repensar o que estamos mostrando para eles”, explica.
Justiça
A Seção de Apuração e Proteção (Seapro) da Vara da Infância e da Juventude do Distrito Federal é responsável por fiscalizar locais onde haja o ingresso de crianças e adolescentes desacompanhados, como cinemas, shows e casas noturnas.
A Seção de Apuração e Proteção (Seapro) da Vara da Infância e da Juventude do Distrito Federal é responsável por fiscalizar locais onde haja o ingresso de crianças e adolescentes desacompanhados, como cinemas, shows e casas noturnas.
Com isso, eles permitem o alvará e iniciam um processo de conscientização com bares e ambulantes para que a venda de bebida ou cigarro seja proibida a menores.
Caso seja constatado que a criança conseguiu comprar álcool dentro do ambiente, os produtores são penalizados. Se houver flagrante, o vendedor é levado à delegacia e responde a processo criminal. O trabalho com os menores, por sua vez, é educativo, por meio de diálogo e de orientação.
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